domingo, 11 de março de 2012

TELÓMANIA DAS ÁRABIAS



Será que o assunto já não está surrado o bastante? A dúvida assombrou nossa proposta de pauta, mas seguimos em frente: não vale matéria o sujeito que faz com que os marroquinos, inclusive os de menor instrução, falem - ou cantem em - português?! 

Michel Teló, como no Brasil, na Europa e em Tangamandápio, também é sucesso absoluto no Reino de Marrocos. "Ai se eu te pego" ganhou versão em árabe, fez os muçulmanos dançarem - e enquanto escrevo o post, já são três carros que passam pela janela de casa com a música no último volume.

Valeu a matéria, sobretudo diante da ligação estreita com o esporte. Tocamos em frente, levamos ao ar. Mas o assunto suscita um debate ainda mais desgastado que o refrão grudento do sertanejo:  cultura de massa versus qualidade. Entre outras coisas. 

As pessoas tendem a adotar a postura de que, se faz sucesso, é ruim. Creio que menos porque acreditam nisso, mais porque se incomodam com o sucesso alheio (opa! isso me lembra a entrevista do Amarante!!); as pessoas em geral não estão preparadas para aceitar o êxito dos outros porque são inseguras, mesquinhas e preguiçosas.

O discurso contra Michel Teló retoma o maniqueísmo que habitualmente permeia discussões como essa: se você não é fã, tem de odiá-lo. Se não o odeia, então é fã - o que, neste caso, é um atributo repleto de conotação pejorativa. Não é possível ou aceitável estar no meio do caminho.

Teló, como qualquer fenômeno de massa, é um convite aos conservadores e pseudo-cultos: "Nós, que já exportamos Tom e Vinícius, hoje exportamos esse tipo de coisa!!!! É a glamourização do sexo fácil! O fetiche pela baixaria!! A banalização dos conceitos pós-modernistas!!!". O brado indignado e envergonhado faz tanto sentido quanto dizer que nós, que já exportamos Pelé, Zico e Falcão, hoje exportamos Hulk e Robinho. 

Quando chegamos ao bairro pobre de Rabat para gravar imagens da criançada, a música de Michel Teló foi a congruência entre mundos distintos. Se os brasileiros usualmente são bem-vindos no exterior, fomos ainda mais acolhidos por causa do rapaz em questão e do refrão que desperta um ódio desnecessário em muita gente.

"Gostar" é uma coisa, "reconhecer" é outra. Particularmente, sou fã. Não porque pretendo ir a um show ou porque escuto a música dele aqui em casa, mas porque Teló cumpre com o mais simples e o mais difícil: traz alegria às pessoas e une povos distantes.

sábado, 3 de março de 2012

um aperto de mão


A carreira de repórter presume contato com o povo. Digo "presume" porque nem todos o fazem na prática; não faltam colegas que prefiram a cadeira da redação ao tête-à-tête. Como assim, repórter que não gosta de gente? É, tem. Mas esse pessoal não importa agora (e quando importa?).

As pessoas são a matéria-prima da reportagem. Sobretudo as pessoas comuns, aquelas que não têm, ao primeiro olhar, algo novo ou impressionante. Suas palavras, sotaques, expressões, sorrisos e até o seu silêncio dão o caminho de uma grande história a ser contada. Parece óbvio, mas nem sempre o jornalista se permite enxergar os detalhes prosaicos de um personagem. 

Dias atrás fomos ao subúrbio de Rabat registrar em poucas cenas a paixão dos meninos marroquinos pelo futebol. Pedimos ao taxista que nos levasse a qualquer lugar que tivesse várias crianças e uma bola. E o Mohamed escolheu a dedo: uma quadra de cimento batido a céu aberto próxima a um aterro de lixo. 

A câmera, o microfone e a camisa com o logotipo que eles não conhecem foram o bastante para que a maioria deixasse o jogo de lado e nos recebesse com euforia. Alguns deles falavam inglês, atentos em mostrar que estão prontos a receber visita estrangeira. Outros, sequer o francês, segunda língua do país. Quase todos, contudo, craques na pronúncia de nomes como Ronaldinho e, sim, Michel Teló. Brasil, Brasil!

Tivemos alguma dificuldade em conter os ânimos da molecada com a nossa presença. "Filhos? Melhor não tê-los!". Algazarra, exercício de paciência. Gravamos o necessário, fiz questão de registrar o momento em foto e partimos em direção ao carro. Eles nos seguiram, perguntaram meu nome e o repetiram certinho inúmeras vezes, Thiago! Thiago!. Perguntaram se voltaríamos, quando, que horas, se voltaríamos mesmo. 

Agradecemos em árabe, em francês, português, inglês e com a mão ao peito esquerdo em sinal de gratidão e cordialidade. E eles ali, atrás, até a porta do carro. A quadra vazia, a bola parada. Amontoaram-se quando estiquei o braço para lhes dar a mão. Um por um. Enchantée! Enchantée!! O táxi partiu e eles acenaram até que dobrássemos a rua e saíssemos de seu horizonte quase sempre esquecido. "Que coisa louca, que coisa linda que os filhos são!". 

Pressupus reportagens em diversos rostos e gestos, mas compreendi algo mais importante do que qualquer VT de um minuto e meio: o meu papel, como correspondente, não é apenas mostrar o Marrocos aos brasileiros. É mostrar aos próprios marroquinos o quão importantes são eles pra nós. 

Mostrar que as suas vidas são tão valiosas quanto um abraço ou aperto de mão.




segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

marrocos?!


O meu destino assim, cheio de interrogações e estranhamento. Mas o que é que tem no Marrocos?! 

Primeiro desafio à vista: responder a uma questão simples e sem rodeios. 

Quando recebemos a lista dos países a serem desbravados pelo Passaporte, nossa reação, em geral, foi a mesma: Marrocos?! O que é que tem no Marrocos?! Sabíamos tanto sobre a tradição esportiva deste país quanto o Tiririca sabia sobre a Câmara dos Deputados quando se candidatou. E minha resposta, em geral, era igual à dele: "Olha, eu ainda não sei... mas te respondo assim que chegar lá!".

Não basta "googlar" duas ou três palavras e descobrir que o atletismo é a principal fonte de medalhas olímpicas dos marroquinos. Não adianta repetir um "salamaleico" e achar que por aqui as pessoas andam de camelo e dançam como a moça da novela. 

O imaginário popular a respeito deste pedaço do mundo é superficial e, não raro, equivocado. Um mês depois de chegarmos, confusos e assustados, estamos surpresos com a diversidade de cenários e modalidades praticadas por aqui.

A primeira resposta que o Marrocos nos deu pode soar óbvia, mas não menos alentadora: não é preciso ser uma potência esportiva para ser um país completamente apaixonado pelo esporte. 

Não descobrimos a pólvora, mas já temos a pista para inúmeras reportagens que respondam, afinal, o que é que tem no Marrocos. 




passaporte, passaporteiros


Compreender o mundo sob a ótica do esporte. Desvendar o contexto político, histórico, econômico e social através dos olhos de quem disputa uma partida no meio da rua ou uma medalha olímpica. Tanto faz.
Praticar jornalismo com o entusiasmo de quem ainda quer mudar o mundo e a sensibilidade de quem enxerga história boa detrás de coisa qualquer. Observar, ininterruptamente observar a vida com olhos de estrangeiro – seja do outro lado do mundo, seja no próprio Brasil. Olhos famintos, alegres, quase tolos. Sentinelas da notícia.
Ser um “passaporteiro” é buscar o inusitado, reportar novidades, fazer diferente. Que o mundo conhece Neymar e idolatra o Pelé, afinal, já sabemos de velho. E ser um “passaporteiro” é renovar; é transpor os limites do imaginário popular. É experimentar e, pretensiosamente, reinventar o exercício da profissão sem deixar de sermos nós mesmos.
Ser um “passaporteiro” é um sonho em comum e um desafio particular. Nossos destinos são diversos como diversas são nossas origens e nossas referências. Cada qual com o seu perfil, o seu time de coração, o seu ângulo para posicionar a câmera e gravar. Todos, porém, com o espírito de que o mundo inteiro é logo ali.
Esperamos, no papel de correspondentes, nem mais nem menos que o trivial: esperamos, pura e simplesmente, corresponder.
Eis um pouquinho de nossa missão.

sobre o blog II


Bom...

Este blog servirá apenas para guardar meus posts publicados na página oficial do Passaporte SporTV:


Ou não.


quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

sobre o blog


Oi?

São memórias fragmentadas. Detalhes que, no papel, resumem meus passos pretensiosos. Reconstituem minhas passagens. Experiência que decerto ficará impressa para sempre naquilo que eu venha a ser depois, mas que, no papel, me traz de volta as sensações perdidas pelo caminho.

Relatos bastante pontuados. Nem sempre, quase nunca pontuais. Prosa caótica como o trânsito de carros e de gente em Casablanca. Como as pombas infinitas no boulevard com o nome do rei.

Mas também pode ser uma foto. Ou uma linha. Um vídeo registrado em telefone celular. E pode ser, por que não, pontual. Contraditório, sempre que possível.

Frases curtas e diversas que reflitam a confusão e o sem-número de observações sobrepostas minuto a minuto. O avesso das reportagens, os personagens cotidianos de uma cultura distante. O que deu e o que não deu matéria. O mar de gente e o deserto. A burca e a Coca-Cola. O futebol e a cachaça proibida.

O susto e o fascínio, enfim, de chegar ao Marrocos.

Tudo é estranho, tudo é estranho demais.

Que assim seja.